(em breve, texto em Francês.)
Theo,
Muito obrigada pelos seus filmes. Não sei nem como agradecer a honra de ter assistido suas obras-primas no cinema na Mostra Internacional de São Paulo. Muito obrigada por ter feito 'Um Olhar a Cada Dia'! Pra mim, é o MELHOR filme que já assisti na vida, o mais lindo de todos. O mais emocionante, o que mais me fez chorar de uma maneira desesperadora. Um filme que me trouxe respostas não só para o Cinema que pretendo dirigir um dia, mas para a vida.
Seu filme fala sobre quase tudo. Pelo menos as coisas mais importantes. Sobre a morte, o amor, o perdão e tantas, tantas outras coisas que são caras a mim. Obrigada, mais uma vez.
Tive a honra de te conhecer pessoalmente durante a Mostra. Não sei se você se lembra, ali no lobby do Hotel Renaissance. O Ernesto, também da equipe do Receptivo da Mostra, que estava cuidando pessoalmente de você e de sua esposa, me apresentou a vocês.
Naquela manhã, o Ernesto me ligou dizendo que precisava de uma caixa de plástico, estilo aquelas que usamos em produção, para dar para sua esposa, que estava com um problema de espaço na mala. Fui prontamente comprar a caixa para entregar para o Ernesto. Assim que o encontrei, entreguei a caixa e pedi muito encarecidamente, que ele me apresentasse a você. Pelo menos pra eu ver o seu rosto, pelo menos pra dizer oi.
Cheguei ao lobby e lá estavam vocês dois sentados. Eu perguntei para o Ernesto quais linguas vocês costumavam falar. Ele me disse que francês e imagino que grego, claro. Cheguei lá, ele me introduziu e eu disse um tímido 'Bonjour', seguido de 'Ça va?'. Você muito simpático, respondeu cordialmente. Logo em seguida me despedi com meu simples 'Au Revoir', para não atrapalhá-los mais. Foi um momento incrível pra mim, apesar de não ter parecido.
Fico pensando no 'destino', no 'acaso', se é que eu acredito nisto. Sabe que meu amigo, Tiago VC, assistente de direção de cinema como eu, que me indicou o primeiro filme seu que assisti: A Eternidade e Um Dia. E sabe o que é pior? Isto foi apenas algumas semanas antes da Mostra!
Passei esses anos todos ouvindo sobre 'Theo Angelopoulos', sabendo que era um diretor grego incrível, mas pelo o acaso das locadoras de vídeo e dvd da minha vida, nunca chegaram nas minhas mãos um filme de tão genial diretor. Mesmo eu sabendo que era genial, mesmo eu sabendo que um dia eu PRECISAVA assistir.
E quando eu digo precisava, eu me refiro literalmente a isso. Porque eu sou uma cinéfila um pouco compulsiva, admito. Ia nas locadoras e pegava com meu ex-namorado (que acabou virando compulsivo também) uns 15 dvds de uma vez. E todos de catálogo. Buñuel, Kubrick, Godard, Truffaut, Antonioni, Fellini, Woody Allen, Monicelli, Michael Haneke, Lars Von Trier, Thomas Vinteberg, Tomás Gutierrez Alea, Tarkovsky, Tarantino, Kieslowski, Bergman, Almodóvar, Kurosawa, Fernando Meirelles, Jorge Furtado, José Eduardo Belmonte, Salles, Lucrecia Martel, Claude Lelouch, Welles, Wenders... e assim por diante.
Fico angustiada e maravilhada com o tanto de filmes que existem no mundo. Tenho vontade de assistir todos...
E assim, depois de anos acreditando que 'O Anjo Exterminador' era o melhor filme do mundo, seguido de 'Laranja Mecânica' e '2001', e depois 'O Discreto Charme da Burguesia', fiquei espantada quando comecei a reavaliar todos os meus conceitos sobre Cinema.
Durante o seu filme 'Um Olhar a Cada Dia', chorei três vezes. E não costumo chorar tanto em filmes... não normalmente. Chorei a primeira vez, na cena em que o protagonista pergunta para a mulher (me desculpe, não me lembro o nome dos personagens) sobre os rolos de filmes. Ela diz que não se sabe, etc. E pergunta por que ele está indo pra Bucareste. Ele, começa a responder, mas não a esta pergunta. Começa a contar uma história. E já notei isto nos seus dois filmes, no A 'Eternidade e Um Dia' também acontece isto. A filha faz uma pergunta para o pai, e ele responde com a história do torneio de tênis. LINDÍSSIMO.
Voltando para 'Um Olhar a Cada Dia'. Ele ao invés de respondê-la, começa a contar sobre o busto de Apolo, que foi descoberto por uma oliveira (não me recordo se era isto mesmo) que caiu com o vento. Ao aproximar do busto, passando por leões e tantas outras coisas, ele fica fascinado. E enquanto ele fala, ela começa a caminhar ao lado do trem, porque o trem dá a partida. E ela interessada nos detalhes da história, cada vez caminha mais rápido para acompanhar o trem e a história. Cena lindíssima, que termina depois de pausas lindas e dramáticas, com um beijo APAIXONADO. Ela se apaixona naquele instante por ele... lindo.
Logo, tem a cena em que ele começa a chorar. Ela pergunta o por quê de ele estar chorando. Ele diz 'é porque eu não posso te amar'. E ela fica triste, e eles se separam.
Mas pra mim, a cena MAIS DESESPERADORA e LINDA, claro, de todas é a que ele chega em uma casa meio em ruínas e há uma mulher. Ela grita. 'Vaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaania'. 'Vaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaania'. É triste! Você percebe que esse tal 'Vania' que ela grita, com certeza morreu, pela dor que ela grita.
Depois, ela entrega umas roupas para o protagonista vestir. Ele se despe por completo em cena. Fica nu. Pausas dramáticas lindíssimas. E veste a roupa. Em seguida, ela começa a beijá-lo. Eles vão para a cama, e ela continua a beijá-lo. Até que pelo olhar (que atuação!) dele, percebemos que ele gosta dela... e ela o beija e começa a dizer em voz alta 'Vania, Vania...'. E ele aceita, e a aceita...
Pra mim, esta cena é de uma nobreza absurda. Não tenho palavras pra dizer o que senti quando assisti... quis sair do cinema, fiquei desesperada. Chorava, muito. Eu, aos prantos, sem saber o que fazer. Estava assistindo o filme sozinha no bar do Cinesesc. E é um cinema incrível, com uma tela enorme. Foi a melhor experiência da minha vida.
E este filme me surpreendeu, porque ele fala de tantas, tantas coisas. Inclusive sobre a Guerra. Ele fala da parte humana, das dores que a Guerra traz. Pra mim, é o melhor filme sobre a Guerra. Como ninguém nunca falou isso antes pra mim?!
Fora a maneira inteligente que o filme é conduzido, sua direção é refinada, pensada, detalhada, sensível. Fiquei admirada! A cena do 'Feliz 1945' é linda, linda.
E sabe o que é mais curioso? Durante o filme, na cena em que ele entra no navio, barco, com a cabeça e o corpo gigante de Lenin cruzando o Danúbio... eu fiquei me perguntando 'Em qual filme já vi isso?'. Tinha certeza que já havia visto esta cena.
Pensei, pensei... até que me lembrei! Foi exatamente neste filme. Eu já tinha assistido o filme!!!
Uma semana antes da Mostra, após ter assistido 'A Eternidade e Um Dia' e ter adorado, pedi pela internet (hoje em dia alugo filmes pela internet, e assim posso ficar o quanto quiser com o dvd) o 'Um Olhar a Cada Dia'.
Só que eu estava em uma fase meio ruim antes da Mostra, desanimada. E coloquei o seu filme pra assistir aqui em casa, sozinha, a tarde, e acabei adormecendo em grande parte do filme!
Mas as cenas iniciais do filme e esta do Lenin, eu me lembrava bem.
E qual foi a coincidência... antes de ontem, esquecendo de tudo isso (pois já faz tempo que este momento aconteceu, foi antes da Mostra), fui olhar quais filmes desta locadora estão na minha casa. Fui checar pra poder ver se já tinha assistido e poder devolver e pegar novos. Quando olho e vejo 'Um Olhar a Cada Dia'!!!!! Fiquei arrepiada. Não imaginava que ele estivesse aqui. E comprei 2 cópias neste mesmo dia!
Enfim, sincronicidades do mundo. Acasos, destinos. Só o que sei é que me indicaram o primeiro filme seu que assisti, depois disso, foi só alegria e surpresas boas. Te conhecer foi uma honra. Ainda mais depois de ver o mais belo filme...
O que teria acontecido se eu tivesse assistindo com atenção 'Um Olhar a Cada Dia' antes da Mostra? Acho que eu teria sido mais dedicada, mais atenciosa com a preciosidade de ter Theo Angelopoulos por perto.
Provavelmente teria confiado mais no meu francês, que estudei um ano. Provavelmente teria me arriscado a conversar nem que fosse cinco frases com você. Nem que fosse pra dizer pessoalmente, que o seu filme é uma inspiração MÁXIMA pra mim.
Obrigada, Theo. Muito obrigada!
Muito, muito obrigada.
Desculpe-me se esta carta ficou um 'pouco' extensa. Desculpe-me se a minha admiração parece exagerada... mas garanto que tudo o que eu disse aqui, estou sentindo no fundo da minha alma.
Espero conseguir algum contato para você ler tudo isto. Seria o maior presente pra mim...
Com carinho e muito, muito respeito,
Tarsila